sexta-feira, 3 de abril de 2009

Sinopse 2009

Em 2007, a recém saída do ovo, filha da serpente edêmica, G.R.E.S.V. Pura Soberba cantou, no Grupo de Avaliação da VirtuaFolia, “O Pecado que nos pariu”, mostrando que os 7 pecados capitais permearam a história do carnaval e, por conseguinte, a história da humanidade.

Em 2008, a mais pecaminosa das escolas de samba virtuais defendeu, no Grupo de Acesso, “Terra Papagalli & os dez mandamentos para vencer no Brasil”, enredo baseado na obra Terra Papagalli, de José Roberto Torero e Marcus Aurelius Pimenta, pós-moderna "narração para preguiçosos leitores da luxuriosa, irada, soberba, invejável, cobiçada e gulosa história do primeiro rei do Brasil". Provou, assim, que os pecados balizaram a história brasileira, dos primeiros tempos aos dias atuais.

Em 2009, ao invadir o Grupo de Elite, a dourado e branco de Niterói mostrará que os mesmos pecados envenenaram a história da fundação de sua cidade-sede. Preparem-se, nobres expectadores e amantes do carnaval malandro, para o fim desta trilogia profana! Vem aí...

“DE NARIZ EM PÉ, EU SOU SOBERBO! HÁ MUITO TEMPO, DO OUTRO LADO DA GUANABARA...”


Cobiça.
No Medievo, o culto às riquezas materiais motivava os alquimistas a dedicarem parte de suas vidas à procura de receitas que levassem à transmutação de metais vulgares em ouro. Na Idade Moderna, o mercantilismo metalista tinha fome e sede de ouro. Ouro, ouro, ouro! Uma corrida maluca em busca do ouro! Reluzia o mito do “El Dorado”, ligado à idéia de que havia um paraíso perdido na Terra. A chegada dos portugueses ao Brasil alimentou a crença de que as terras de cá poderiam ser o tal paraíso, ainda que sem qualquer indício do tão cobiçado ouro; o comércio nas Índias falou mais alto e os lusitanos deixaram a Terra Papagalli em banho-maria.

Os franceses não perderam tempo: invadiram nossa praia e passaram a explorar o pau-brasil, única riqueza até então encontrada em lugar de clima tão ameno, natureza tão exuberante e homens tão contraditórios (de um lado, a preguiçosa docilidade do bom selvagem; do outro, a furiosa e temível comilança canibal!). No luxuriante harém das bananeiras, os piratas faziam a festa!

O vermelho tingiu a Europa, em especial a França, e o Brasil ditou a moda de alguns invernos e verões do Velho Mundo. Vermelho urucum, vermelho pitanga, vermelho guará, vermelho guaraná, vermelho arara, vermelho cobra coral... Vermelhou geral, levando a vaidosa nobreza francesa a olhar com mais cuidado para as terras d’além-mar. Ibirapitanga Fashion!

A curiosidade era tanta que em 1550 cerca de 50 índios foram levados para a cidade de Rouen, onde foi organizada uma festa brasileira, com combates simulados, animais selvagens, músicas e danças típicas do Novo Mundo, cenografia especialmente preparada, banquetes de fazer inveja a qualquer glutão, etc. O festerê tupiniquim bombou, encantando o rei Henrique II, a rainha Catarina de Médicis e a amante oficial do rei, Diana de Poitiers.
Encantado também ficou um nobre chamado Nicolau Durand Villegagnon. Ele, que praticara feitos heróicos em suas aventuras mundo afora (e que também conhecia os aposentos de Diana...), decidiu viajar ao Brasil e fundar uma colônia, a França Antártica, sediada em Henriville e protegida pelo forte Coligny. Isso preocupou os portugueses, que investiram contra o projeto francês e deram início a sangrentas batalhas, tendo a Baía da Guanabara como cenário. Nesse contexto, é fundado o Rio de Janeiro. A “utopia tropical” de Villegagnon, que havia se aliado aos índios Tamoios e Tupinambás, foi destruída pelas tropas de Estácio e Mem de Sá, que se aliaram aos Temiminós. Quando do massacre indígena final, Villegagnon já havia retornado à Europa e era conhecido pelo epíteto com que fora presenteado pelos colonos franceses (em sua maioria protestantes), que estavam imensamente descontentes com a sua postura: “Caim da América”.

Em meio ao conflito, um chefe temiminó chamado Araribóia (“Cobra Feroz”) se destacou, despertando a ira de tamoios e tupinambás, que o julgaram um traidor da causa indígena. Do governo português, este guerreiro (que teria atravessado a baía a nado para atacar o forte Coligny!) ganhou o direito de escolher uma sesmaria para fixar o seu povo. O lugar escolhido? São Lourenço e Caraí, numa região de “águas escondidas”, do outro lado da Guanabara: “Nictheroy”, fundada em novembro de 1573. Malandro do seu jeito, o cacique Araribóia “loteou Niterói e fez do índio seu office-boy”, como canta o samba do Império Serrano. Passou a administrar o lugar pautado nos modelos do colonizador (as “Organizações Araribóia”), adotou nome de branco (Martim Afonso), recebeu honrarias do rei Dom Sebastião, sagrou-se Capitão-Mor e foi agraciado com a comenda da Ordem de Cristo! Paletó emplumado na cadeira, os pés a descansar na mesa. Patrão.

“São Lourenço dos Índios” cresceu, prosperou. Mais de quatro séculos se passaram e Niterói, a “Cidade Sorriso”, tornou-se um invejável símbolo de qualidade de vida. Lugar de belezas naturais, como o costão de Itacoatiara e as praias oceânicas; de samba no pé (Salve Ismael Silva!), na Cubango, na Viradouro ou nas demais escolas e blocos carnavalescos; de arte no museu cartão-postal e de boemia na Cantareira; de festejos de São João, o santo padroeiro, e de um povo apaixonado. “Nikiti” tornou-se, enfim, a casa da mais soberba das escolas de samba virtuais. A cobiça original, porém, continuava à espreita; afinal, o pecado mora ao lado, nas praias de Adão e Eva.

Eis que o legado de um poeta-profeta, artista que das chamas do Gran Circus Norte-Americano fez a sua anti-alquimia, é resgatado pelo nosso carnaval. Plantando flores, oferecendo vinho, pregando nas barcas, com seu estandarte em punho, palavras de paz, amor e harmonia, o andarilho solitário, que já fora um bem-sucedido empresário do ramo dos transportes, ensinava e redimia. José Datrino se fez José Agradecido, ou simplesmente Gentileza. Valorizou a natureza, a espiritualidade e a solidariedade. Pintou esperança em verde e amarelo. E começou em Niterói a sua simples e refinada missão: divina, humana, eterna. A pureza do branco ilumina a avenida. Niterói, terra sagrada!
Finalizando a nossa utopia, as barcas levam mensagens ao mundo, o sol da nova era surge, um arco-íris colore o céu. Faz-se uma ponte a unir os homens a um outro nível de sabedoria. Contra o capeta capital. Do brilho do ouro ao brilho da arte. Do ouro metal ao ouro do coração.
Redenção.

“Estrela Guia
Que guiou nossos pais
Guiai nossos filhos
Pros caminhos que eles vais.”


Leonardo Augusto Bora – carnavalesco

Nenhum comentário: